Outro dia eu peguei o telefone e liguei pra uma amiga minha.
Eu: Alô... a Si...
Pessoa que atendeu: Não, não está.
Eu: Mas será que e...
Pessoa que atendeu: Demora sim. Talvez chegue só amanhã.
Eu: Então por fa...
Pessoa que atendeu: Sim, eu deixo recado. Tchau.
Eu: Tch... (tu tu tu tu tu...)
Há pessoas que não gostam muito de conversa. E algumas dessas algumas pessoas explicitam muito bem isso numa conversa telefônica como esta descrita aí em cima, cortando suas palavras e quase adivinhando o que você quer dizer. Ainda se quem atendeu fosse a mãe da garota seria um pouquinho justificável, mas não, era a empregada. Não que eu tenha algo contra empregadas domésticas, não (até porque sou pobre e minha família nunca teve uma); mas aquela se sente a dona da casa, do tipo que se sente mais importante que a patroa. E, por alguns motivos que não caberiam aqui, já há tempos nutro antipatia por esta pessoa que foi minha interlocutora na curta conversa telefônica.
Engraçado é que isso me fez lembrar de uma época distante (tá, nem tanto) da minha vida, quando eu estava na sexta série e tinha uns 12 anos. Tinha uma amiguinha da classe que se chamava Marília. Uma gracinha, tanto interna como externamente. E ela tinha vários amiguinhos na classe, entre eles eu.
Essa menina morava num prédio próximo à minha casa, então depois da aula eu e os coleguinhas combinávamos de ir na casa dela, ficar conversando no portão. Coisa de molecada, até rolavam uns beijinhos escondidos atrás do prédio de vez em quando.
A mãe dessa menina, quando começou a ver que, a cada dia, a portaria do prédio continuava infestada daqueles pirralhos de 12 anos de idade "que não tinham nada pra fazer", deu ordem expressa ao porteiro pra que ele não deixasse ninguém entrar no prédio, e nem mesmo interfonasse no apartamento pra chamar a garota. Foi a corda pro cara se sentir poderoso.
Nós, os moleques vagabundos, continuávamos indo ao prédio procurar por Marília, mas o porteiro negava constantemente sua presença no prédio. "Ela saiu", ele sempre dizia.
Nós telefonávamos e ela nos atendia, quando chegávamos no prédio o cara dizia que não estava. Até que um dia combinamos uma "operação de guerra". Ligaríamos e pediríamos pra ela descer, quando ela já estivesse lá embaixo o porteiro chato não poderia fazer mais nada.
Chegamos, lá estava a menina nos esperando, pedimos pro porteiro abrir, e recebemos uma negativa. Marília pediu, inutilmente. Ao que o homem bigodudo respondeu:
-Sinto muito. Ordens de Dona Márcia.
Passou o tempo, muitas coisas aconteceram. Depois de onze anos ainda tenho contato com aqueles moleques vagabundos que, hoje, trabalham e estudam, assim como eu. Sempre saímos pra tomar uma cerveja. Foi num desses dias que, estávamos no Largo da Matriz da Freguesia do Ó, em São Paulo, e era época de campanha política. Então havia muitos santinhos e propagandas de políticos emporcalhando a calçada, a rua, as mesas, os botecos e até nossos bolsos. Quando vem uma mulher falar de suas propostas pra nós, que estávamos sentados à mesa e apreciando a Schin gelada (que não é a melhor, mas é a mais barata).
Eu lembrava daquele rosto. Os moleques também lembravam. Ficamos ouvindo dois minutos a ladainha, quando a mulher entregou o panfleto com o nome: Márcia Barral, candidata a vereadora.
Ela perguntou: "Vocês já têm candidato para vereador?"
Eu respondi: "Não tenho, mas na senhora eu não voto. SE a gente pudesse ter subido no apartamento da Marília há ONZE anos atrás, até pensaria a respeito."
Os moleques olharam com cara de espanto. A candidata olhou pra mim, com cara de desaprovação, depois deu um sorriso amarelíssimo, virou as costas e nem continuou a panfletar.
Depois olhei pros moleques, eles olharam pra mim, e foi só risada. Mas risada mesmo foi quando descobrimos que esta distinta senhora não conseguiu sua vaga
Agora, depois de ler este puta post enorme
Agora podem me xingar.
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